Por Marcelo Lemos*
Desafios de imagem, de produtividade, de tecnologia, de sustentabilidade, de extensão rural, de segurança. São muitas e já conhecidas as barreiras que o agricultor brasileiro precisa superar para agregar valor à sua produção e conquistar espaço em mercados cada vez mais complexos e exigentes. Ultimamente, porém, um obstáculo extra tem dificultado a atividade no campo. O entrave é protagonizado por parlamentares de assembleias legislativas que acabam tomando decisões que ignoram critérios técnicos e democráticos. Alguns projetos aprovados revelam total falta de conexão com a realidade do nosso setor, ignorando completamente os princípios econômicos em torno de qualquer atividade produtiva.
O exemplo mais recente aconteceu no Mato Grosso, onde um grupo de parlamentares se uniu para deslegitimar a ação movida pela Sociedade Rural Brasileira (SRB) no Supremo Tribunal Federal (STF) que contesta a constitucionalidade do Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab). O fundo, que incide sobre a comercialização de commodities no Estado, ficou mais caro para os agricultores no ano passado, quando o governo mato-grossense ampliou a alíquota de tributação para produtos como boi,soja, algodão, milho, entre outros. Os argumentos dos deputados foram acatados e, em março deste ano, o ministro do STF Gilmar Mendes decidiu pela falta de legitimidade ativa da SRB para ajuizar a medida, se esquivando do mérito da questão e que deverá ser revisto pelo Plenário do STF.
Ora, a SRB, entidade centenária, é reconhecida internacionalmente e nacionalmente como uma das principais organizações do agro brasileiro representativas dos produtores. Além disso, representou na ação apresentada ao Judiciário produtores rurais que se sentem pressionados pelos sucessivos aumentos da carga tributária no Estado.
Nesse contexto, o mais contraditório é que, na semana anterior ao arquivamento da ação no Supremo, deputados da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) aprovaram um Projeto de Lei que eleva o salário de servidores públicos a níveis acima do permitido pela Constituição. O “PL dos Marajás”, como ficou popularmente conhecido, aumentou os rendimentos dos conselheiros, procurador-geral, procuradores, auditores e técnicos instrutivos e de controle para R$ 70 mil, sem necessidade de prestação de contas.
A aprovação do PL é uma decisão desconectada da realidade de um Estado que, no ano passado, chegou a decretar situação de calamidade financeira. Mato Grosso deveria dar exemplo, cortando gastos sem onerar o agro, um dos setores que mais contribuem com geração de renda e emprego no Estado.
Vale destacar que episódios como o do Fethab não estão restritos a Mato Grosso e já se espalharam por assembleias legislativas de todo Brasil. Um dos efeitos desse cenário é a perda do apetite de investidores, cada vez mais desestimulados em aplicar recursos em Estados que criam obstáculos ao desenvolvimento do agronegócio. O aumento desenfreado da carga tributária também eleva os custos de produção, faz o produtor perder competitividade e prejudica toda sociedade. Diante dos anseios atuais dos cidadãos que pedem cada vez mais por menos interferência do Estado, é urgente que nossos representantes se alinhem à realidade do agro nacional, vetor de evolução social e econômica para nossa sociedade.
*Diretor Jurídico da Sociedade Rural Brasileira (SRB)